sábado, 23 de agosto de 2008

15º Encontro do dia 21/08

Reflexão sobre o filme Desmundo, de Alain Fresnot:

O filme se passa em 1570 e retrata a sociedade portuguesa que habitava no Brasil da época, mostrando, entre outros aspectos a exploração sexual e do trabalho escravo de indígenas, negros e mulheres, além da total marginalização destas em submissão aos desejos masculinos. Trata também das relações comerciais inescrupulosas entre os membros da igreja e os senhores de terras na roca de favores e 'bens' como escravos e esposas.
As informações sobre a história do Brasil são a total falta de escrúpulos da sociedade da época, na qual os homens brancos impunham sua vontade à força e exploravam como bem entendiam o trabalho daqueles que não tinham condições de se defender (no caso, os indígenas, os negros e as mulheres órfãs).
Os personagens utilizam formas linguísticas muito peculiares, típicas do seu país, Portugal. Percebe-se muito claramente a tentativa de indígenas e africanos de continuar se comunicando em sua língua de origem. Quanto ao português lusitano, nota-se como principais traços o uso do pronome e do verbo em segunda pessoa, uso da ênclise e mesóclise na colocação pronominal, hoje tão raros na nossa comunicação, além de vários termos do léxico que também já caíram em desuso.
A diferença entre as formas linguísticas usadas no filme e a nossa língua portuguesa de hoje é tão grande que há dificuldade em compreender várias cenas por causa do vocabulário usado. Isso se deve, certamente, ao fato de ter sofrido inúmeras modificações ao longo de mais de quatrocentos anos em nosso país, além de adaptações e influências de outras línguas, principalmente indígenas, africanas, árabe e, mais recentemente inglês. Quase não é possível uma compreensão da linguagem usada no filme sem recorrer a outros recursos da fala, como a imagem, expressão facial e corporal, entonação e o contexto enfim.
A história da língua portuguesa é relevante para nossos alunos, pois possibilita compreender alguns aspectos da enorme diferença entre língua escrita e língua falada. Entender, por exemplo, que a norma padrão nos parece tão estranha porque se baseia na estrutura da língua de origem, o português lusitano, que utiliza várias formas por nós já abolidas na fala do cotidiano. Entender que a norma padrão demora muito tempo para se adaptar às modificações rápidas que ocorrem na língua falada, por issonão leva em consideração aquilo que não pode acompanhar, que são as variantes linguísticas, tão influenciadas pela região, idade, classe social, manifestações culturais e outros aspectos. A norma padrão não pode e nem deve mesmo abarcar todas essas variantes, senão não seria padrão. A norma padrão é assim mesmo: restrita, elitista, excludente; no entanto necessária. Nem mais nem menos importante que as variantes linguísticas, apenas mais uma forma de comunicação na língua que deve ser ensinada na escola. Algo que todo aluno tem o direito (não o dever, a imposição) de saber para se apropriar dela quando achar necessário. Conhecer essa história da língua é mais uma ferramenta para compreender os usos e possibilidades da linguagem e descobrir-se como agente desse processo de transformação contínua ao qual a língua está exposta.

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